quinta-feira, abril 26, 2007

Que vem de lá

Eu sei que sou só uma falsa baiana, disse, olhando fixamente o altar. E pediu um pouco de paz ao Senhor do Bonfim, que prontamente atendeu ao seu pedido, fazendo cair sobre Salvador uma chuva de lavar as almas. Com os passos curtos, chegou à porta da igreja e fechou os olhos, pisando o degrau inferior e sentindo os pingos grossos das lágrimas do céu. Sentiu calafrios e labirintos, tremores e pontadas. Abriu os olhos e era noite, mas permaneceu ali, em pé. A falsa baiana só se moveu nas vezes em que o frio lhe entortou o corpo involuntário. Bebeu um pouco da chuva e chorou um pouco das lágrimas. Mas o pedido dela se tornou realidade e, no fim das contas, valeu a pena, pensou.
Ali no Bonfim, a falsa baiana sentiu paz pela primeira vez, desde que saíra de São Raimundo Nonato rumo a Salvador. Esqueceu da fome que lá sentira e dos filhos que lá deixara. E esse momento de paz, e frio, e dor a confortou mais que qualquer pão duro que já tivera comido no Piauí. Por algum estranho motivo, o santo baiano era bem mais forte que o tal do Nonato.

quarta-feira, abril 18, 2007

De línguas e idiomas

Ela se apaixonara pela língua dele. Não, não… pelo idioma.
Pela língua também, mas… bem, não vem ao caso.
Ela era uma daqueles que o recomendavam não perder o sotaque. Ela dizia que era parte do charme.
Mas depois de tantos anos juntos, ele eventualmente perdeu seu jeitão ímpar de pronunciar as palavras. E o charme também, me parece. Acabou desenvolvendo, involuntariamente quase, um sotaque nova-iorquino... cheio de R’s enrolados e T’s e D’s rapidamente estalados.
E ela o deixou.
Acho até que ainda gostava da língua dele. Mas seu idioma se perdeu no inglês. E seu charme também, me parece.

terça-feira, abril 10, 2007

Velha Irene

Irene trocou Bahia por Espanha. Estuda cinema em Madri e passa as férias em Barcelona. Faz amigos em espanhol.
Mas ainda sente falta do cheiro de dendê que tem Salvador.